A menina que enfrentou a Bruxa: Soninha Francine
Esses contos foram feitos com intenção de “traduzir” para a linguagem mitológica alguns aspectos da vida real da mulher entrevistada no nosso livro O feminino e o sagrado: mulheres na jornada do herói.
Então, para esclarecer os que ainda não leram o livro e relembrar a quem leu, antes do conto vamos colocar um pouco da biografia da pessoa a quem se refere.
A conversa com Soninha aconteceu na pequena sala, atulhada de livros e papéis, em seu gabinete na Câmara dos Vereadores de São Paulo.
Magra, morena, cabelos compridos, usando jeans e tênis, ela parece bem mais jovem do que é. Elétrica, fala bastante; tem olhos atentos, vivos, mas tristes, e é extremamente simpática e acolhedora.
Soninha Francine, formada pela ECA, três filhas, é vereadora da cidade de São Paulo, sempre atuou em vários meios de comunicação e em ONGs, e tem um vasto currículo ligado a causas das mais bacanas.
Ainda jovem, uma depressão a levou a procurar o sentido da vida, que acabou encontrando, pelas mãos da Lama Tsering, no budismo tibetano. Assim, hoje segue trabalhando nos dois ambientes (mídia e política), que talvez sejam os mais difíceis para alguém com um comportamento pautado por valores como a compaixão.
Uma menina magricela estava cruzando a floresta, quando uma Bruxa saltou de trás de uma arvore e parou bem na sua frente.
- Saia da frente, por favor, minha senhora, pediu a menina.
- Só saio se você me responder algumas perguntas, queridinha.
- Faça sem demora, então.
- Você vai morrer algum dia?
- Claro que sim; todo o mundo morre, não é verdade?
- Quando tiver filhos, eles irão morrer?
- Algum dia sim, claro.
- Então, queridinha, para que você estuda? Para que vai trabalhar? Para que você se esforça, se, no fim, tudo vai dar na mesma: na sua morte? E para que você vai ter filhos, se eles também vão morrer?
A menina não soube o que responder. Ficou ali parada, respirando o hálito gelado da Bruxa, que repetia:
- Você está se esforçando para que? Para que, para que? Para que serve a vida, menina?
Com uma grande risada, a Bruxa passou a mão numa vassoura que estava encostada na arvore e saiu voando em círculos cada vez mais amplos, gritando em sua voz esganiçada:
- A vida não serve para nada, queridinha! Para nada, para nada, nada...
E a menina não saiu mais do lugar.
Tinha ficado enfeitiçada; por mais que tentasse, não se mexia. Caiu a noite, e a densa escuridão da floresta era ainda menor que a escuridão que a Bruxa tinha trazido a seu coração.
Na manhã seguinte, um lenhador a viu ali, ainda parada como estatua. Percebendo que ela tinha caído em algum malefício, foi buscar o curandeiro da aldeia, que lhe deu umas pílulas amarelas.
Depois de tomar os remédios, a menina sentiu-se melhor e voltou para casa, mas a feitiçaria não passou.
Apesar de levar uma vida normal, a escuridão daquela noite ainda habitava o seu coração. Nos momentos de solidão, pensava nas perguntas da bruxa, que não conseguia responder.
Até que, num belo dia, ela conheceu três amigos, que eram sempre gentis e não se perturbavam com as coisas que aborreciam as outras pessoas.
A menina acabou descobrindo o que fazia com que eles fossem diferentes dos outros: eles tinham uma grande Mestra.
Quando a conheceu, viu que era tão linda quanto a Bruxa era feia. Em seu Templo, a menina praticou antigos rituais, aprendeu a sair de feitiços, e a procurar em sua própria mente as respostas para as mais difíceis perguntas.
Aos poucos, a escuridão que ainda sentia dentro de si foi clareando.
Mas, para que realmente terminasse, ela sabia que precisaria enfrentar a Bruxa novamente.
Criou coragem, foi para a floresta, e esperou.
Logo a Bruxa apareceu de novo e perguntou, lá de cima mesmo, girando em sua vassoura:
- Para que serve a vida, menina? A vida não serve para nada, nada...
Antes que ela falasse o terceiro nada, a menina levantou a cabeça e gritou com voz alta e clara:
- Serve sim, serve sim. A vida serve para servir aos outros.
Ouvindo aquilo, a Bruxa deu um guincho e desapareceu numa nuvem cinzenta.
Quando a escuridão de dentro da menina se dissipou, toda a floresta pareceu clarear. E assim, tendo desfeito o malefício, a menina foi trabalhar na grande Casa Comunitária, onde alegremente serve a todo povo.
Só que, hoje em dia, ás vezes ela suspeita que ambas, a Bruxa e a Mestra, são duas faces da mesma coisa (como um problema e sua solução, por exemplo), e que aparecem assim divididas justamente para fazer com que a gente se responda a essa pergunta.
Então, para esclarecer os que ainda não leram o livro e relembrar a quem leu, antes do conto vamos colocar um pouco da biografia da pessoa a quem se refere.
A conversa com Soninha aconteceu na pequena sala, atulhada de livros e papéis, em seu gabinete na Câmara dos Vereadores de São Paulo.
Magra, morena, cabelos compridos, usando jeans e tênis, ela parece bem mais jovem do que é. Elétrica, fala bastante; tem olhos atentos, vivos, mas tristes, e é extremamente simpática e acolhedora.
Soninha Francine, formada pela ECA, três filhas, é vereadora da cidade de São Paulo, sempre atuou em vários meios de comunicação e em ONGs, e tem um vasto currículo ligado a causas das mais bacanas.
Ainda jovem, uma depressão a levou a procurar o sentido da vida, que acabou encontrando, pelas mãos da Lama Tsering, no budismo tibetano. Assim, hoje segue trabalhando nos dois ambientes (mídia e política), que talvez sejam os mais difíceis para alguém com um comportamento pautado por valores como a compaixão.
Uma menina magricela estava cruzando a floresta, quando uma Bruxa saltou de trás de uma arvore e parou bem na sua frente.
- Saia da frente, por favor, minha senhora, pediu a menina.
- Só saio se você me responder algumas perguntas, queridinha.
- Faça sem demora, então.
- Você vai morrer algum dia?
- Claro que sim; todo o mundo morre, não é verdade?
- Quando tiver filhos, eles irão morrer?
- Algum dia sim, claro.
- Então, queridinha, para que você estuda? Para que vai trabalhar? Para que você se esforça, se, no fim, tudo vai dar na mesma: na sua morte? E para que você vai ter filhos, se eles também vão morrer?
A menina não soube o que responder. Ficou ali parada, respirando o hálito gelado da Bruxa, que repetia:
- Você está se esforçando para que? Para que, para que? Para que serve a vida, menina?
Com uma grande risada, a Bruxa passou a mão numa vassoura que estava encostada na arvore e saiu voando em círculos cada vez mais amplos, gritando em sua voz esganiçada:
- A vida não serve para nada, queridinha! Para nada, para nada, nada...
E a menina não saiu mais do lugar.
Tinha ficado enfeitiçada; por mais que tentasse, não se mexia. Caiu a noite, e a densa escuridão da floresta era ainda menor que a escuridão que a Bruxa tinha trazido a seu coração.
Na manhã seguinte, um lenhador a viu ali, ainda parada como estatua. Percebendo que ela tinha caído em algum malefício, foi buscar o curandeiro da aldeia, que lhe deu umas pílulas amarelas.
Depois de tomar os remédios, a menina sentiu-se melhor e voltou para casa, mas a feitiçaria não passou.
Apesar de levar uma vida normal, a escuridão daquela noite ainda habitava o seu coração. Nos momentos de solidão, pensava nas perguntas da bruxa, que não conseguia responder.
Até que, num belo dia, ela conheceu três amigos, que eram sempre gentis e não se perturbavam com as coisas que aborreciam as outras pessoas.
A menina acabou descobrindo o que fazia com que eles fossem diferentes dos outros: eles tinham uma grande Mestra.
Quando a conheceu, viu que era tão linda quanto a Bruxa era feia. Em seu Templo, a menina praticou antigos rituais, aprendeu a sair de feitiços, e a procurar em sua própria mente as respostas para as mais difíceis perguntas.
Aos poucos, a escuridão que ainda sentia dentro de si foi clareando.
Mas, para que realmente terminasse, ela sabia que precisaria enfrentar a Bruxa novamente.
Criou coragem, foi para a floresta, e esperou.
Logo a Bruxa apareceu de novo e perguntou, lá de cima mesmo, girando em sua vassoura:
- Para que serve a vida, menina? A vida não serve para nada, nada...
Antes que ela falasse o terceiro nada, a menina levantou a cabeça e gritou com voz alta e clara:
- Serve sim, serve sim. A vida serve para servir aos outros.
Ouvindo aquilo, a Bruxa deu um guincho e desapareceu numa nuvem cinzenta.
Quando a escuridão de dentro da menina se dissipou, toda a floresta pareceu clarear. E assim, tendo desfeito o malefício, a menina foi trabalhar na grande Casa Comunitária, onde alegremente serve a todo povo.
Só que, hoje em dia, ás vezes ela suspeita que ambas, a Bruxa e a Mestra, são duas faces da mesma coisa (como um problema e sua solução, por exemplo), e que aparecem assim divididas justamente para fazer com que a gente se responda a essa pergunta.
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